O juiz Thiago Gonçalves Alvarez, da 3ª Vara Cível de São Vicente (SP) determinou, na última quinta-feira (29), que os planos de saúde S u l A m é r i c a e Q u a l i c o r p forneçam produto à base de canabidiol, derivado da planta Cannabis, a uma menina de três anos, que sofre, dentre outras doenças, de epilepsia focal estrutural grave.
O magistrado concedeu a tutela de urgência antecipada, atendendo ao pedido do advogado da criança, Fabricio Posocco, do escritório Posocco & Advogados Associados. Deste modo, as rés têm cinco dias para providenciar o fármaco sob pena de multa diária de R$ 1 mil, até o limite de R$ 100 mil.
A mãe da menina procurou a Justiça depois que o pediatra neonatologista e a neuropediatra receitaram a substância para controlar as crises diárias de convulsões, mas os planos de saúde negaram o tratamento.
Segundo a S u l A m é r i c a e a Q u a l i c o r p, o medicamento não consta no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Para o juiz, que analisou o caso, “as doenças de que padece a autora constam da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde (OMS) e estão, por isso, aparentemente cobertas pelo plano de saúde contratado”.
Na decisão judicial, o magistrado citou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ): “O plano de saúde pode estabelecer quais doenças estão sendo cobertas, mas não que tipo de tratamento está alcançado para respectiva cura”; e do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP): “Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS”.
Dito isto, Alvarez ordenou que as rés providenciem o canabidiol 200 mg/ml, na dose de 1ml de 12/12h, ao longo do tratamento domiciliar da autora e nos termos da recomendação e prescrição médicas. “Preferencialmente, o produto Canabidiol Prati-Donaduzzi, fabricado pela Prati-Donaduzzi, no Brasil”.
História da pequena guerreira
A menina nasceu com cardiopatia congênita, que é uma malformação cardíaca ocorrida durante o desenvolvimento do coração do feto no útero materno. Por isso, com 7 meses de vida foi submetida à plastia de válvula mitral. A cirurgia tem como objetivo conservar ao máximo a estrutura original, reparando o que for necessário, mas não correu bem. Após 10 dias, necessitou de colocação de prótese valvar. Ficou sedada por mais de 10 dias e seu quadro evoluiu para acidente vascular cerebral isquêmico (AVCi).
Como sequela, a criança apresenta epilepsia focal estrutural grave, paralisia cerebral, transtornos específicos da fala e da linguagem. O quadro leva ao atraso do desenvolvimento neuropsicomotor, podendo gerar deficiência intelectual.
Ao longo desses três anos, a menina fez uso de diversas medicações antiepiléticas sem melhora nas crises, como Fenobarbital, Vigabatrina, Topiramato, Nitrazepam e Levetiracetam. Além de seis meses de dieta cetogênica, que também mostrou-se ineficaz.
Com epilepsia de difícil controle, seus médicos iniciaram o uso de canabidiol e constataram redução de 80% das crises convulsivas no primeiro mês da utilização do produto.
"Melhorou muito sua qualidade de vida. Também nota-se grande avanço no desenvolvimento neuropsicomotor”, afirmou a neuropediatra e neurofisiologista Paula Girotto.
"O recurso terapêutico apresentou bom controle dos espasmos, tornando-a mais alerta, mais interativa com a família e mais participativa nas sessões de reabilitação", revelou o pediatra neonatologista Allan Chiaratti de Oliveira.
Com esses bons resultados, a família, que não tem recursos financeiros, pede para que os planos de saúde, das quais a criança é beneficiária, forneçam a substância, comercializada por R$ 4.789,90.
De acordo com o advogado Fabricio Posocco, a necessidade do tratamento almejado não decorre da vontade do paciente ou de seus pais, mas sim de indicação médica que visa garantir a integridade física, a saúde e a própria vida da menina, que necessita, urgentemente, do canabidiol, sob pena de piora nas suas condições clínicas, podendo culminar com a sua morte. “Não fica difícil reconhecer que a pequena autora é uma guerreira, que vem lutando dia a dia com grandes dificuldades para sua regular sobrevivência”.
A ação segue no Poder Judiciário. A família também discute a existência de danos morais em favor da menor, por causa da negativa do plano de saúde em fornecer o medicamento.
Fonte: SEGS Leia a matéria completa
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