A decisão do Conselho Federal de Medicina de suspender os efeitos da controversa resolução que restringia o uso terapêutico de produtos canabinoides no país trouxe alívio para pacientes e médicos que prescrevem a terapia. Com a calmaria por ora, a atenção agora se volta para outra discussão, que se desenrola na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa): a de atualização das regras para o setor.
A adequação já estava prevista em 2019, quando a primeira norma foi publicada. E deve vir acompanhada de debates importantes, que vão desde a ampliação das classes profissionais que podem prescrever a terapia, a regras para registro.
Diretora da Anvisa, Meiruze Freitas estima que a revisão das regras para fabricação, importação e fiscalização de produtos de cannabis para fins medicinais seja colocada em consulta pública em meados de 2023.
Embora a RDC 327/2019 estabeleça que a atualização deva ser feita em três anos (prazo que termina em novembro), por causa da complexidade do tema e da importância dada aos mecanismos de participação social, eventuais mudanças são esperadas somente no próximo ano. Enquanto isso, valem as regras atuais. “Não haverá nenhum prejuízo”, disse Freitas.
O processo teve início com o E-Participa, um mecanismo usado pela primeira vez na agência para coletar informações e dados durante o processo regulatório. O recebimento das contribuições para a revisão da RDc começou em outubro e vai até 17 de novembro.
Terminada esta fase, a equipe técnica da agência deve preparar uma proposta de minuta de RDC. O documento será avaliado pela diretoria colegiada da Anvisa, submetido a consulta pública e, a partir de contribuições e ajustes, um texto final poderá ser votado pelo colegiado.
Em entrevista ao JOTA, Freitas lista alguns pontos que deverão ser avaliados na revisão. Um deles é a via de administração. Pela regra atual, produtos de Cannabis somente são de uso oral. A expectativa é de que outras formas, como pomadas ou aplicação nasal possam ser avaliadas. “Mas, para isso, será necessária a comprovação da eficácia”, disse Freitas.
A equipe técnica deve avaliar também quesitos de eficácia. Meiruze observa que, ao longo dos últimos três anos, a produção científica sobre o tema aumentou e hoje há mais elementos para algumas decisões. “Com o maior volume de dados técnicos e científicos, talvez possamos discutir também a comprovação da eficácia”, disse. E isso abre espaço para que indicações do produto sejam incluídas. Hoje, tais produtos não trazem bulas. No Canadá, por exemplo, algumas indicações já começam a ser inseridas. “Talvez possamos fazer o mesmo”.
Também são passíveis de avaliação outros dois temas: a permissão de prescrição por outros profissionais da saúde, por exemplo por dentistas e, ainda, regras para manipulação de produtos com canabidiol. Esse segundo ponto, contudo, depende de uma análise mais rigorosa. “A qualidade da matéria prima tem de ser muito bem controlada, para não ter efeitos adversos”, observa Freitas.
Outra discussão que provavelmente pode surgir é em relação às receitas exigidas nos pontos de venda. Atualmente, para produtos com teor de THC inferior a 2%, é usado o receituário tipo B (azul, em duas vias). Para produtos com teor de THC superior a esse percentual, é exigido o receituário tipo A (amarelo).
“Há possibilidade de que haja discussão sobre propostas de mudanças para aqueles com THC inferior a 2%. Um dos debates, mas que está a cargo da gerência de produtos controlados, é de regras mais simples. Como o uso de receituário branco, em duas vias, semelhante ao que é usado para antidepressivos”.
Desde que a norma entrou em vigor, 21 produtos de cannabis foram aprovados pela Anvisa. No entanto, nem todos estão disponíveis no mercado. O descompasso é provocado por questões inerentes às fabricantes e parcerias feitas entre empresas estrangeiras e representantes nacionais. A expectativa é de que esse número se amplie.
Enquanto a oferta de produtos no país for limitada, a tendência é de que facilidades na importação do produto sejam mantidas. A importação é permitida por força de decisão judicial. Mas, ao longo dos últimos anos, a Anvisa facilitou o processo de importação, justamente para garantir acesso aos pacientes.
Fonte: JOTA. Leia matéria completa.
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